segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Whitney, Meu Amor ( OPINIÃO)

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Judith McNaught


Sinopse
Órfã de mãe e criada por um pai severo e frio, a adolescente Whitney Stone choca a sociedade inglesa do começo do século XIX com seus modos, sua espontaneidade e rebeldia.
Desde menina, ela ama o belo e aristocrático Paul, perseguindo-o em todos os lugares e inventando as mais inusitadas formas de chamar-lhe a atenção.
Enviada a Paris, ela recebe um longo treinamento para transformar-se uma mulher fina, glamourosa, irresistível. Quando retorna a Londres, está mudada, mas ainda disposta a conquistar seu amor de infância.
Porém o irascível e poderoso duque Clayton Westmoreland é quem se interessa mais vivamente pela jovem mulher. E é ele quem, por meio de artimanhas maquiavélicas, consegue levá-la ao altar.
Mas Whitney recusa-se a aceitar imposições, e está disposta a fazer tudo para livrar-se do odioso casamento. A convivência, porém, traz surpresas, e dentro de pouco tempo o duque se revela muito mais charmoso e gentil do que ela desejaria admitir.

Talvez Paul não passe de uma fantasia infantil; talvez Clayton tenha bons motivos para agir  tão brutalmente; talvez o casamento não seja um erro tão grande assim…




Este é o livro mais conhecido de Judith Mcnaught. É o segundo livro da série Westmoreland e uma relíquia preciosa entre os seus fans. Quase, porque alguns não conseguiram gostar do Clayton, um duque bem-parecido com os outros: rico, arrogante e poderoso. Este Duque, acha-se o homem mais bem-parecido à face da terra – e tem razões para tal – mas, como todos os seres humanos, tem as suas fraquezas. Claro que não vou dizer quais, não é!
Este livro teve tanto sucesso na época em que foi lançado (1985) que a autora, a pedido dos leitores, escreveu UM REINO DE SONHO, o Westmoreland 1, e depois de Whitney escreveu outro dando continuidade a este. 
Adoro romances históricos - em doses repartidas -, e confesso que não foi uma boa altura para o ler. Tinha terminado um do género e a certa altura, estava com um certo enjoo. No entanto isso não tira o mérito ao livro. Caro leitor(a), devemos repartir as nossas leituras de forma a não enjoarmos do género. Como sou uma leitora de vários géneros (histórico, policial, noir, contemporâneo entre outros), tento alternar as leituras, mas, a curiosidade face a uma escritora que eu admiro, falou mais alto.
Whitney é uma jovem completamente apaixonada pelo seu vizinho Paul, e faz as maiores trifólias para chamar a sua atenção. O seu pai decide que ela deve ir morar com os tios em Paris para que possa receber uma educação adequada. Passam anos e Whitney é a grande sensação de Paris. Sua beleza, encanto e personalidade encantam todos, até mesmo o duque Westmoreland que não recebe a atenção devida ao seu título e resolve que aquela jovem deverá ser sua esposa. Para isso ele descobre que o  pai de Whitney está falido e compra a noiva. Pede sigilo, exige que ela volte para a Inglaterra, muda-se para perto da casa dela usando um nome falso a fim de conquistá-la. Só que isso não será nada fácil, ela continua apaixonada por Paul e decidida a casar com o seu amor de adolescente.
Algumas partes do livro são cómicas, como esta que transcrevo a seguir.

"— Pode ser salteador ou até pirata, mas duque? Do mesmo modo que sou rainha — replicou.
O sorriso dele desapareceu, dando lugar a uma expressão confusa.
— Posso saber por que acha tão impossível que eu seja?
Pensando no único duque que conhecera em toda sua vida, Whitney olhou-o da cabeça aos pés.
— Em primeiro lugar, se fosse duque, usaria um monóculo — argumentou.
— Como eu poderia usar um monóculo, se estou de máscara?
— Duques não usam monóculos para ver melhor, mas por pura afetação —  declarou. — É através deles que examinam as mulheres reunidas num baile. Mas essa não é a única razão pela qual o senhor não pode ser duque. Não usa bengala, não ofega, não torce a boca com descaso e, desculpe a honestidade, não me parece que sofra de gota."
Whitney e Clayton protagonizam cenas inesquecível de amor, ciúmes, desentendimentos, encontros e desencontros.
É um livro que faz suspirar, ter raiva e amar.
Relatar mais sobre o livro é contar partes que o leitor tem que descobrir ao longo da leitura, não quero estragar as várias surpresas do livro.
É um livro que ama ou odeia.
Avaliei em  5 estrelas  na GoodReads 

Caderneta de baile

Ficha técnica

ISBN: 9789892339948Edição ou reimpressão: 09-2017Editor: Edições AsaIdioma: PortuguêsDimensões: 155 x 233 x 43 mmEncadernação: Capa molePáginas: 640Tipo de Produto: LivroClassificação Temática: Livros em Português > Literatura > Romance



Como posso adquirir o livro? AQUI. 

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Jürgen Habermas: “Não pode haver intelectuais se não há leitores


Hoje, trago-vos um tema diferente, embora relacionado com a literatura. Apesar de publicar sobretudo livros de entretenimento, para quem não me conhece, sou apaixonada pela filosofia, comunicação e tudo o que se refira ao "pensar" o ser humano. Li esta entrevista do professor Habermas, grande pensador, e não resisti a deixá-la aqui, porque vai de encontro ao que tenho pensado nos últimos tempos, sobre a leitura e o poder que ela pode ter.
Já se perguntaram porque é que a maioria dos alunos portugueses escolhe Ciências e não Letras? Sou mãe de um jovem de 15 anos que este ano optou por seguir Estudos Humanísticos, e tem ouvido "perólas" do género: que letras não serve para nada, que letras é para o desemprego entre outras coisas...
Uma sociedade que não lê, é uma sociedade que não pensa, porque não existe nada mais perigoso do que a LITERACIA.



Prestes a completar 89 anos, o filósofo vivo mais influente do mundo está em plena forma. O velho professor alemão, discípulo de Adorno e sobrevivente da Escola de Frankfurt, mantém mão de ferro em seus julgamentos sobre as questões essenciais de hoje e de sempre, que continua destilando em livros e artigos. Os nacionalismos, a imigração, a Internet, a construção europeia e a crise da filosofia são alguns dos temas tratados durante este encontro na sua casa em Starnberg


Ao redor o lago de Starnberg, a 50 quilômetros de Munique, se amontoam sucessivas fileiras de chalés de estilo alpino. A única exceção às esmagadoras doses de melancolia, madeira escura e flores nas sacadas surge na forma de um bloco branco e compacto de cantos suaves, com janelas grandes e quadradas como única concessão à sobriedade. É o racionalismo feito arquitetura no país da Heidi. A Bauhaus e sua modernidade raivosa no meio da Baviera eterna e conservadora. Uma minúscula placa branca sobre uma porta azul confirma que ali vive Jürgen Habermas (Düsseldorf, 1929), sem dúvida o filósofo vivo mais influente do mundo por sua trajetória, sua obra publicada e sua atividade frenética até hoje, quando falta um mês e meio para que complete 89 anos. Sua esposa há mais de 60 anos, a historiadora Ute Wesselhoeft, nos recebe no pequeno vestíbulo e demora apenas alguns segundos para girar a cabeça e exclamar: “Jürgen, os senhores da Espanha chegaram!”. Ambos habitam esta casa desde 1971, quando Habermas passou a dirigir o Instituto Max Planck de Ciências Sociais.

MAIS INFORMAÇÕES:
Jürgen Habermas: “Não pode haver intelectuais se não há leitores” Mais Séneca e menos ansiolíticos
Jürgen Habermas: “Não pode haver intelectuais se não há leitores” Noam Chomsky: “As pessoas já não acreditam nos fatos”
O discípulo e assistente de Theodor Adorno, além de membro insigne da segunda geração da Escola de Frankfurt e ex-catedrático de Filosofia na Universidade Goethe de Frankfurt, avança vindo do seu escritório, uma adorável bagunça de papéis e livros em estado de caos, cujos janelões dão para uma floresta. Aperta a mão com força. É muito alto, caminha muito ereto e tem uma espetacular mata de cabelos brancos como a neve. Cumprimenta afável e convida a sentar num dos grandes sofás. O cômodo está decorado em tons brancos e areia e acolhe uma pequena coleção de arte moderna que inclui pinturas de Hans Hartung, Eduardo Chillida, Sean Scully e Günter Fruhtrunk e esculturas de Oteiza e Miró (esta última simboliza o Prêmio Príncipe de Astúrias de Ciências Sociais recebido em 2003). Abre-se imponente ao visitante a biblioteca de Habermas, que aloja velhos volumes de Goethe e de Hölderlin, de Schiller e de Von Kleist, e fileiras inteiras de obras de Engels, Marx, Joyce, Broch, Walser, Hermann Hesse e Günter Grass, entre uma infinidade de escritores e pensadores.

“Não pode haver intelectuais comprometidos se já não há mais leitores a quem continuar alcançando com argumentos”

O autor de obras imprescindíveis do pensamento, da sociologia e da ciência política do século XX, como Mudança Estrutural da Esfera Pública, Conhecimento e Interesse, O Discurso Filosófico da Modernidade e Teoria da Ação Comunicativa, troca impressões com o EL PAÍS a respeito de alguns dos temas que lhe preocuparam durante seis décadas e continuam a preocupá-lo. Com uma exceção: o entrevistado preferiu evitar qualquer questão relacionada ao passado nazista de seu país e à sua própria experiência a respeito (foi membro das Juventudes Hitlerianas — por obrigação, como tantos compatriotas seus). Habermas está furioso. “Sim…, continuo furioso com algumas das coisas que ocorrem no mundo. Isso não é ruim, não é?”, brinca.

Pergunta. Professor Habermas, fala-se muito na decadência da figura do intelectual comprometido. Considera justo esse julgamento? Não é frequentemente um mero tema de conversa entre os próprios intelectuais?

 Jürgen Habermas: “Não pode haver intelectuais se não há leitores”
GORKA LEJARCEGI
Resposta. Para a figura do intelectual, tal como a conhecemos no paradigma francês, de Zola até Sartre e Bourdieu, foi determinante uma esfera pública cujas frágeis estruturas estão experimentando agora um processo acelerado de deterioração. A pergunta nostálgica de por que já não há mais intelectuais está mal formulada. Eles não podem existir se já não há mais leitores aos quais continuar alcançando com seus argumentos.

“A única forma de fazer frente às ondas mundiais de emigração seria combater suas causas econômicas nos países de origem”

P. É possível pensar que a Internet acabou por diluir essa esfera pública que antes talvez fosse garantida pela grande mídia tradicional e que isso afetou a repercussão dos filósofos e dos pensadores?

R. Sim. Desde Heinrich Heine, a figura histórica do intelectual ganhou importância junto com a esfera pública liberal em sua configuração clássica. No entanto, esta vive de certos pressupostos culturais e sociais inverossímeis, principalmente da existência de um jornalismo desperto, com meios de referência e uma imprensa de massa capaz de despertar o interesse da grande maioria da população para temas relevantes na formação da opinião pública. E também da existência de uma população leitora que se interessa por política e tem um bom nível educacional, acostumada ao processo conflitivo de formação de opinião, que reserva um tempo para ler a imprensa independente de qualidade. Hoje em dia, essa infraestrutura não está mais intacta. Talvez, que eu saiba, se mantenha em países como Espanha, França e Alemanha. Mas também neles o efeito fragmentador da Internet deslocou o papel dos meios de comunicação tradicionais, pelo menos entre as novas gerações. Antes que entrassem em jogo essas tendências centrífugas e atomizadoras das novas mídias, a desintegração da esfera populacional já tinha começado com a mercantilização da atenção pública. Os Estados Unidos com o domínio exclusivo da televisão privada é um exemplo chocante disso. Hoje os novos meios de comunicação praticam uma modalidade muito mais insidiosa de mercantilização. Nela, o objetivo não é diretamente a atenção dos consumidores, mas a exploração económica do perfil privado dos usuários. Roubam-se os dados dos clientes sem seu conhecimento para poder manipulá-los melhor, às vezes até com fins políticos perversos, como acabamos de saber pelo escândalo do Facebook.

P. O senhor acredita que a Internet, para além de suas indiscutíveis vantagens, criou uma espécie de novo analfabetismo?

R. O senhor se refere às controvérsias agressivas, às bolhas e às histórias falsas de Donald Trump em seus tuítes. Deste indivíduo não se pode dizer sequer que esteja abaixo do nível da cultura política de seu país. Trump baixa esse nível constantemente. Desde a invenção do livro impresso, que transformou todas as pessoas em leitores potenciais, foi preciso passar séculos até que toda a população aprendesse a ler. A Internet, que nos transforma todos em autores potenciais, não tem mais do que duas décadas. É possível que com o tempo aprendamos a lidar com as redes sociais de forma civilizada. A Internet abriu milhões de nichos subculturais úteis nos quais se troca informação confiável e opiniões fundamentadas. Pensemos não só nos blogs de cientistas que intensificam seu trabalho acadêmico por este meio, mas também, por exemplo, nos pacientes que sofrem de uma doença rara e entram em contato com outra pessoa na mesma condição em outro continente para se ajudar mutuamente com conselhos e experiências. Sem dúvida, são grandes benefícios da comunicação, que não servem só para aumentar a velocidade das transações na Bolsa e dos especuladores. Sou velho demais para julgar o impulso cultural que as novas mídias vão gerar. O que me irrita é o fato de que se trata da primeira revolução da mídia na história da humanidade que serve antes de tudo a fins econômicos, e não culturais.

P. No cenário hipertecnologizado de hoje, onde triunfam os saberes úteis, por assim dizer, qual o papel e sobretudo qual o futuro da filosofia?

R. Veja, sou da antiquada opinião de que a filosofia deveria continuar tentando responder às perguntas de Kant: o que é possível saber? O que devo fazer? o que me cabe esperar? E o que é o ser humano? No entanto, não tenho certeza de que a filosofia, como a conhecemos, tenha futuro. Atualmente segue, como todas as disciplinas, a corrente no sentido de uma especialização cada vez maior. E isso é um beco sem saída, porque a filosofia deveria tentar explicar o todo, contribuir para a explicação racional de nossa forma de entender a nós mesmos e ao mundo.

P. O que resta de sua orientação marxista? Jürgen Habermas continua sendo um homem de esquerda?


R. Estou há 65 anos trabalhando e lutando na universidade e na esfera pública em favor de postulados de esquerda. Se há 25 anos advogo pelo aprofundamento político da União Europeia, faço isso com a ideia de que apenas esse regime continental poderia domar um capitalismo que se tornou selvagem. Jamais deixei de criticar o capitalismo, nem tampouco de ter consciência de que não bastam diagnósticos vagos. Não sou desses intelectuais que atiram a esmo.

P. Kant + Hegel + Iluminismo + marxismo desencantado = Habermas. Essa equação é suficiente para resolver o “x” de sua ideologia e pensamento?

R. Se é preciso expressá-los de forma telegráfica, estou de acordo, apesar de ainda faltar uma pitada da dialética negativa de Adorno...

P. O senhor cunhou em 1986 o conceito político do patriotismo constitucional, que hoje soa quase medicinal diante de outros supostos patriotismos de hino e bandeira. É muito mais difícil exercer o primeiro do que o segundo, não?

R. Em 1984, pronunciei uma conferência no Congresso espanhol a convite de seu presidente, e no fim fomos comer em um restaurante histórico. Ficava, se não me engano, entre o Parlamento e a Porta do Sol, na calçada da esquerda. Seja como for, durante a conversa animada com nossos impressionantes anfitriões — muitos deles eram colegas socialdemocratas que tinham participado da redação da nova Constituição do país —, minha esposa e eu nos inteiramos de que nesse lugar tinha acontecido a conspiração para preparar a proclamação da Primeira República espanhola de 1873. Ao saber disso, experimentamos uma sensação totalmente diferente. O patriotismo constitucional exige um relato apropriado para que tenhamos sempre presente que a Constituição é a conquista de uma história nacional.

P. E nesse sentido o senhor se considera um patriota?

R. Me sinto patriota de um país que, finalmente, depois da Segunda Guerra Mundial, deu à luz uma democracia estável, e ao longo das décadas subsequentes de polarização política, uma cultura política liberal. Hesito em declarar isso e, de fato, é a primeira vez que faço isso, mas nesse sentido sim, sou um patriota alemão, além de um produto da cultura alemã.

P. De que cultura alemã? Só há uma ou há culturas alemãs?

R. Sinto-me orgulhoso dessa cultura também em relação à segunda ou terceira geração de imigrantes turcos, iranianos, gregos, ou de onde quer que tenham chegado, que aparecem de repente na esfera pública como cineastas, jornalistas e os apresentadores de televisão mais fabulosos; como executivos e os médicos mais competentes, ou como os melhores literatos, políticos, músicos e professores. Tudo isso constitui uma demonstração palpável da força e da capacidade de regeneração de nossa cultura. A rejeição agressiva dos populistas de direita contra as pessoas sem as quais essa demonstração teria sido impossível é uma bobagem.

P. Acredito que o senhor prepara um novo livro sobre a religião e sua força simbólica e semântica como remédio para certas lacunas da modernidade. Pode nos contar um pouco desse projeto?

R. Bem, na verdade este livro não fala tanto de religião, mas de filosofia. Espero que a genealogia de um pensamento pós-metafísico desenvolvido a partir de um discurso milenar sobre a fé e o conhecimento possa contribuir para que uma filosofia progressivamente degradada como ciência não esqueça sua função esclarecedora.

P. Falando de religiões e de guerra de religiões e culturas, levando-se em conta o atual nível de intransigência e os fundamentalismos de todo tipo, o senhor acredita que rumamos para um choque de civilizações? Será que já estejamos imersos nele?

R. Em minha opinião, essa tese é totalmente equivocada. As civilizações mais antigas e influentes se caracterizaram pelas metafísicas e as grandes religiões estudadas por Max Weber. Todas elas têm um potencial universalista, e por isso se construíram sobre a base da abertura e da inclusão. A verdade é que o fundamentalismo religioso é um fenómeno totalmente moderno. Remonta à alienação social que surgiu e continua surgindo em consequência do colonialismo, da descolonização e da globalização capitalista.

P. O senhor escreveu certa ocasião que a Europa deveria fomentar um islã ilustrado e europeu. Acredita que isso esteja ocorrendo?

R. Na República Federal Alemã nos esforçamos por incluir em nossas universidades a teologia islâmica, de forma que possamos formar professores de religião em nosso próprio país e não tenhamos de continuar importando-os da Turquia ou de outros lugares. Mas, na essência, esse processo depende de conseguirmos integrar verdadeiramente as famílias imigrantes. No entanto, isso nem de longe é suficiente para conter as ondas mundiais de imigração. A única maneira de enfrentar isso seria combater as causas económicas nos países de origem.

P. E como se faz isso?

R. Não me pergunte como se faz isso sem mudanças no sistema económico mundial do capitalismo. É um problema de séculos. Não sou especialista, mas leia o livro de Stephan Lessenich Die Externalisierungsgesellschaft [A sociedade da externalização] e verá que a origem das ondas que agora refluem para a Europa e o mundo ocidental está exatamente nisso.

P. “A Europa é um gigante económico e um anão político.” Assinado: Jürgen Habermas. Nada parece ter ficado melhor depois do Brexit, dos populismos e extremismos, dos movimentos nazistas, das tentativas nacionalistas de separação da Escócia e Catalunha...

R. A introdução do euro dividiu a comunidade monetária em norte e sul, em vencedores e perdedores. A causa é que as diferenças estruturais entre as regiões económicas nacionais não podem ser compensadas se não se avança no sentido da união política. Faltam válvulas, como por exemplo a mobilidade em um mercado de trabalho único ou um sistema de segurança social comum, e faltam competências europeias para uma política fiscal comum. A isso se acrescenta o modelo político neoliberal incorporado aos tratados europeus, que reforça mais ainda a dependência dos Estados nacionais em relação aos mercados globalizados. O elevado desemprego juvenil nos países do sul é um escândalo absurdo. A desigualdade aumentou em todos os nossos países e erodiu a coesão populacional. Os que conseguem se adaptar aderem ao modelo económico liberal que orienta a ação em benefício próprio; entre os que se encontram em situação precária, espalha-se os medos regressivos e as reações de ira irracionais e autodestrutivas.

P. O senhor acompanha de perto o problema catalão? Qual a sua opinião e diagnóstico?

R. Realmente qual é o motivo de um povo culto e avançado como a Catalunha desejar estar sozinha na Europa? Não entendo. Me dá a sensação de que tudo se reduz a questões económicas... Não sei o que vai acontecer. O que lhe parece?

P. Acredito que pensar em isolar politicamente uma população de cerca de dois milhões de pessoas com aspirações independentistas não é realista. E sem dúvida não é simples...

R. Sem dúvida é um problema, sim. É muita gente.

Jürgen Habermas fala com muita dificuldade, pois nasceu com fissura labiopalatina. Uma pequena tragédia pessoal para alguém cuja missão filosófica primordial sempre foi valorizar a linguagem e a dimensão social e comunicativa do homem como remédio de tantos males (tudo isso compilado em sua célebre Teoria da ação comunicativa). O velho professor se mostra realista e resignado quando, olhando pela janela, sussurra: “Já não gosto dos grandes auditórios nem dos grandes salões. Não entendo bem as coisas. Há uma cacofonia que me desespera”.

P. Professor, o senhor considera os Estados-nação mais necessários do que nunca ou, pelo contrário, acredita que de alguma forma estão superados?

R. Hum, talvez não devesse dizer isso, mas considero que os Estados-nação foram algo em que quase ninguém acreditava mas que precisaram ser inventados em seu tempo por razões eminentemente pragmáticas.

P. Sempre culpamos os políticos pelo fracasso da construção europeia, mas nós, cidadãos comuns da UE, não temos nossa parcela da culpa? Nós, europeus, realmente acreditamos na europeidade?

R. Vejamos... Até agora as lideranças políticas e os governos levaram adiante o projeto de maneira elitista, sem incluir as populações dos países nessas questões complexas. Tenho a impressão de que sequer os partidos políticos e os deputados dos Parlamentos nacionais se familiarizaram com a complicada matéria da política europeia. Sob o lema “mamãe cuida do seu dinheiro”, Merkel e Schäuble protegeram durante a crise, de forma verdadeiramente exemplar, suas medidas contra a esfera pública.

P. A Alemanha conserva uma vocação de liderança europeia? A Alemanha confundiu às vezes liderança com hegemonia? E a França? Que papel deve desempenhar o país liderado por seu querido presidente Macron?

R. Seguramente, o problema foi, na verdade, que o Governo federal alemão sequer teve o talento ou a experiência de uma potência hegemónica. Do contrário teria sabido que não é possível manter a Europa unida sem levar em conta os interesses dos demais Estados. Nas duas últimas décadas, a República Federal agiu cada vez mais como uma potência nacionalista no terreno económico. No que se refere a Macron, continua tentando persuadir Merkel de que é preciso pensar em sua imagem com vistas aos livros de história.

P. Que papel o senhor acredita que a Espanha pode desempenhar na melhoria da construção europeia?

R. A Espanha simplesmente tem de respaldar Macron.

P. Em artigos recentes o senhor defendeu com paixão a figura do presidente Macron que, veja só, é filósofo como o senhor. O que mais o atrai nele? Acredita que é um bom político por ser filósofo?

R. Por Deus, nada de governantes filósofos! No entanto, Macron me inspira respeito porque, no cenário político atual, é o único que se atreve a ter uma perspectiva política; que, como pessoa intelectual e orador convincente, persegue as metas políticas acertadas para a Europa; que, nas circunstâncias quase desesperadas da contenda eleitoral, demonstrou valor pessoal e que, até agora, em seu cargo de presidente, faz o que disse que ia fazer. E em uma época de perda de identidade política paralisante, aprendi a apreciar essas qualidades pessoais contrárias às minhas convicções marxistas.

P. No entanto, é impossível no momento saber qual é a ideologia dele... caso exista.

R. Sim, tem razão. Até o momento continuo sem ver claramente que convicções estão por trás da política europeia do presidente francês. Gostaria de saber se pelo menos é um liberal de esquerda convicto, e isso é o que espero.

Esta entrevista, que se pode realizar graças à colaboração do professor e escritor Daniel Innerarity, é um cruzamento de caminhos entre respostas oferecidas por escrito e trocas de impressões durante aquela manhã em Starnberg. Quando a conversa terminou, o único sobrevivente da segunda Escola de Frankfurt desapareceu de repente atrás da porta da cozinha de sua casa. Voltou com um sorriso cúmplice no rosto, trazendo uma garrafa de Rioja em uma mão e uma de Riesling na outra. Espanha e Alemanha, juntas na casa de Habermas.


Ler entrevista na fonte, AQUI. 

domingo, 14 de outubro de 2018

Histórias de Sherlock Holmes ( Novidade)


Sir Arthur Conan Doyle

Sinopse

O maior detetive de todos os tempos. Nesta coleção de doze histórias engenhosamente tecidas, nenhum caso se torna grande, pequeno ou excessivamente bizarro para Holmes. Seja no combate aos grandes planos de um falsificador de moeda seja na revelação de segredos de família calados durante anos, Sherlock Holmes, em todos eles, mostra-se um adversário temível.

Acompanhado pelo Dr. Watson, seu amigo de confiança, «a máquina de raciocínio e de observação mais eficaz que o mundo já viu» usa os seus dons analíticos únicos para confundir os criminosos e desvendar todos os mistérios.

O AUTOR
Médico e escritor escocês, nasceu a 22 de maio de 1859, em Edimburgo, e faleceu a 7 de julho de 1930. Notável contador de histórias, que concebia com grande poder imaginativo, tornou-se extremamente popular a partir da publicação da primeira aventura do detetive Sherlock Holmes, em 1887. Seguiram-se dezenas de histórias com Holmes como protagonista. Para além destas obras, Doyle publicou também narrativas históricas (como The White Company) e de ficção científica (como The Lost World).

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Marina - Carlos Ruiz Zafón (Novidade)

SINOPSE
A história inesquecível que precedeu A Sombra do Vento

Óscar Drai sonha acordado, deslumbrado pelos palacetes modernistas próximos do internato onde estuda.

Numa das escapadelas nocturnas conhece Marina, uma rapariga audaz e misteriosa que irá viver com ele a aventura de penetrar num enigma doloroso do passado da cidade e de um segredo de família obscuro.
O AUTOR
Carlos Ruiz Zafón nasceu em Barcelona em 1964. Inicia a sua carreira literária em 1993 com El Príncipe de la Niebla (Prémio Edebé), a que se seguem El Palacio de la MedianocheLas Luces de Septiembre (reunidos no volume La Trilogía de la Niebla) e Marina. Em 2001 publica A Sombra do Vento, que rapidamente se transforma num fenómeno literário internacional. Com O Jogo de Anjo (2008) regressa ao Cemitério dos Livros Esquecidos. As suas obras foram traduzidas em mais de quarenta línguas e conquistaram numerosos prémios e milhões de leitores nos cinco continentes. Actualmente, Carlos Ruiz Zafón reside em Los Angeles, onde trabalha nos seus romances, e colabora habitualmente com La Vanguardia e El País.

domingo, 7 de outubro de 2018

A Concubina Russa


Kate Furnivall

SINOPSE


Exiladas da Rússia após a Revolução Bolchevique, a bela e destemida Lydia e a sua aristocrática mãe refugiam-se em Junchow, na China.

Sozinha e sem recursos, Lydia serve-se da sua astúcia para sobreviver, ludibriando e roubando estrangeiros desprevenidos.
Nas ousadas investidas que faz pela cidade chinesa, Lydia cruza-se com um jovem comunista chinês, Chang An Lo, que a salva da morte certa, num perigoso confronto com as tríades chinesas.
Nesta atmosfera de perigo e exotismo, entre raptos, traições e o tráfico de ópio, Lydia e Chang apaixonam-se, desafiando o preconceito e a desonra. 



OPINIÃO

Este é um livro que se ama ou se odeia, e se estava à espera de um romance do tipo agua com açúcar (ainda bem que não é!), enganei-me redondamente. A CONCUBINA RUSSA é um épico histórico, muito bem escrito.
 O título pareceu-me um tanto ou quanto estranho, uma vez que não considerei a personagem a que se refere (a mãe de Lydia) como sendo uma mulher desse tipo. Na minha opinião LYDIA seria mais adequado, no entanto foi a escolha da autora e os autores é que sabem.
O facto de a personagem principal do livro ter o meu nome, ao princípio provocou-me alguma dissonância, mas com a progressão na leitura passou e dei comigo a apreciar a impulsividade da minha homónima, e a temer que ela se metesse em mais problemas. A rapariga era dura na queda, numa época em que as mulheres poucos direitos tinham, e cuja vida pouco valia. Lydia não desistia dos seus propósitos nem que os obstáculos fossem quase sempre intransponíveis.  Aborda o tema da miscigenação, com o romance entre Lydia e Chang An Lo, um romance improvável, mas que tem um desfecho pouco previsível, dadas as circunstâncias históricas.  
A primeira parte do livro foi mais massuda de ler, e talvez por isso demorei mais que o habitual num livro com 500 páginas. Retrata a revolução bolchevique que afectou a nobreza russa, e as provações que os refugiados nobres passaram na china para onde alguns fugiram. Muito interessante do ponto de vista histórico, personagens cativantes e, por vezes, as descrições são tão realistas que incomodam. Não é um livro fofinho, muito pelo contrário, descreve grandes atrocidades e torturas tão difíceis de imaginar, mas que a autora, consegue transmitir com muita clareza.  
Foi um daqueles livros que deixaram ressaca literária. Recomendo

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Promessa de Veludo ( Novidade)


Jude Devereaux chega-nos com uma nova saga, depois da saga de EDILEAN e de AS NOIVAS DE NANTUCKET.

Série Quarteto de Veludo - Livro 1
SINOPSE
Ela pertence-lhe. Mas ele pertence a outra.
Gavin Montgomery está apaixonado. Jurou o seu amor eterno, está cego de paixão. Infelizmente, não é pela mulher que se encontra a seu lado no altar. Pois a sua amada Lady Alice casou com outro e ele pretende agora casar por conveniência, com uma jovem que está a ver pela primeira vez…

Lady Judith, no entanto, é de uma beleza eletrizante. Basta um toque da sua mão para despertar em Gavin um desejo abrasador. Mas, ao descobrir que o marido ama outra mulher, Judith jura a si mesma que ele não verá senão ódio nos seus olhos. Terá de lhe oferecer o seu corpo, mas o coração? Nunca.

O destino de ambos, porém, já está traçado. Será Gavin capaz de se libertar do feitiço de uma amante implacável?

Com Promessa de Veludo, Jude Deveraux dá início a uma arrebatadora saga de família, plena de emoção e surpresas.

(OPINIÃO EM BREVE)

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

O dia em que te perdi (Novidade)



Lesley Pearse ( Novidade)


SINOPSE

Na noite em que a mãe lhes foi arrancada, os gémeos Maisy e Duncan perceberam que só podiam contar um com o outro. Se até então a vida deles não fora fácil, a partir desse momento piora dramaticamente pois o pai decide enviá-los para casa da avó, a ríspida Violet.

Os gémeos sentem-se mais abandonados do que nunca. Mas a negligência da avó tem um lado positivo: Maisy e Duncan passam a desfrutar de uma liberdade inesperada e podem explorar o campo e fazer novas amizades sem terem de se justificar a ninguém. Até ao dia em que Duncan desaparece sem deixar rasto.

À medida que os dias dão lugar a semanas, perante a ineficácia da polícia e a indiferença da avó, Maisy decide descobrir por si própria o que aconteceu à única pessoa que verdadeiramente ama. E vai começar por Grace Deville, a excêntrica amiga do irmão. Grace vive isolada na floresta... e tem segredos por revelar…

O Dia em Que Te Perdi explora ternamente temas delicados e atuais. Lesley Pearse, uma contadora de histórias nata, fala-nos de perda, de esperança, de força interior, e dos inquebráveis laços de família.





domingo, 2 de setembro de 2018

A Boa Filha


Autora - Karin Slaughter



Sinopse 

Duas meninas são obrigadas a entrar no bosque com uma pistola apontada.
Uma foge para salvar a vida. A outra fica para trás.
Há vinte e oito anos, um crime horrível sacudiu a feliz vida familiar de Charlotte e Samantha Quinn. A sua mãe foi morta. O seu pai, um conhecido advogado de defesa de Pikeville, ficou prostrado de dor. A família desfez-se irremediavelmente, consumida pelos segredos daquela noite pavorosa.
Transcorridos vinte e oito anos, Charlie tornou-se advogada, seguindo os passos do pai. É a filha ideal. Mas quando a violência volta a aumentar em Pikeville e uma grande tragédia assola a localidade, Charlie vê-se imersa num pesadelo. Não só é a primeira pessoa a chegar à cena do crime, mas também o caso desperta as recordações que tentou manter à margem durante quase três décadas. Porque a surpreendente verdade sobre o acontecimento que destruiu a sua família não pode permanecer oculta para sempre.

Cheio de voltas e reviravoltas inesperadas e transbordante de emoção, A Boa Filha é um romance apaixonante: suspense em estado puro.


Este livro foi a minha estreia nesta autora. Gosto de livros grandes, tenho sempre a impressão que o prazer de o ler vai ser maior pois a história prolonga-se por mais tempo. São 700 páginas de voltas e reviravoltas e com descrições que roçam a crueldade, escritas de forma magistral. 
A autora prendeu-me desde o inicio do livro com as suas palavras, sim, porque ela usa os diálogos de uma forma que prende o leitor. quem está à espera de descrições fabulosas de cenários e ambientes, esqueça, este livro é sobre emoções no que elas tem de mais primitivo. 
A autora escreveu um thriller de cortar o fôlego e, só mesmo no final ela nos deixa "adivinhar" quem é de fato o homicida do inicio do livro. 
A história começa no passado, volta ao presente e de novo ao passado numa circularidade que eu perdi o numero de vezes em que há um salto temporal, mas que nunca perdi o sentido do que estava a acontecer. Misturam-se várias histórias - e nisto reside um dos encantos deste livro -, em que as personagens se revém nos acontecimentos que dizem respeito aos outros, sem nunca o leitor suspeitar que o assassino, ou os assassinos, não eram quem parecia ser. É um livro assustador, violento e cruel que nos descreve o mundo dos "redneck" a cru e sem qualquer romantismo.

Lídia Craveiro



segunda-feira, 20 de agosto de 2018

Ser feliz com livros - Como criar um leitor


Cresci entre livros e, não há melhor forma de estar  do que rodeada deles.
 Quer isso dizer que fui estimulada a ler?
Sim, mas não só.
 A curiosidade natural e inata levou-me a descobrir o prazer da leitura desde que "meti" a mão num punhado de livros de banda desenhada de Walt Disney, lá muito atrás, nos anos sessenta, quando devia ter uns seis anos.  Eu digo "meti" a mão, não porque os tivesse roubado, mas porque os achei empilhados junto ao lixo, mesmo a pedirem para os levar para casa.
E levei.
Devorei as imagens durante uns bons dias, tentando adivinhar a história e, a minha mãe, que infelizmente não foi à escola muito tempo, mas ficou a conhecer as letras e os números, começou a ensinar-me o alfabeto. Porém, a senhora minha mãe,  também tinha a paciência de ver as imagens comigo e contava-me a história à maneira dela, sem saber o que lá estava escrito.
Grande mulher a minha mãe! Cresceu numa época em que as crianças trabalhavam para ajudar a família e em que poucas pessoas sabiam ler. A literacia era um luxo inacessível às classes pobres, à qual pertencia.
Guardei esses livros durante anos até que um dia, já no final da primeira classe, os fui buscar e descobri que conseguia lê-los. Começou aí a minha aventura como leitora - mais ou menos por volta de 1970 - até aos dias que correm.
Como mãe consegui que a minha filha e o meu filho gostassem de livros, embora com ele tivesse sido mais complicado, porque já nasceu na época do digital. E agora tenho a missão de "contagiar" a neta de dois anos. Esta vida não é fácil!

Vamos agora a outra perspectiva um pouco mais pedagógica.
Para os pais que gostam de livros e de ler - sim, porque podem gostar de livros para enfeitar as prateleiras e não os ler -, a melhor forma que tem de contagiar as crianças, como se de uma doença se tratasse, é ler-lhe histórias.
 Ler uma história a uma criança, aguça-lhe a curiosidade pelo que existe dentro do livro e, um dia, quando souber ler, vai descobrir por si mesma como viajar por uma história, ou por um tema qualquer que tenha interesse. Os livros contribuem para o desenvolvimento das crianças e são um aliado muito saudável na vida adulta.

Como não se nasce leitor é necessário acompanhar a criança nesse percurso, embora, nesta época seja difícil combater o apelo dos ecrãs. No entanto convém contrariar essa tendência. Troque o tablet por um livro, que um dia o seu filho agradece-lhe.
No genoma humano não existe uma inclinação natural para os livros, mas existe o gene da leitura, e como tal podemos sempre incentivar, dando o exemplo e lendo histórias às crianças desde que elas estejam capaz de nos dar atenção uns poucos minutos, mesmo que de seguida, puxem as páginas do livro, ou puxem por outro para ver o que lá está dentro, parecendo não se interessarem. Os pais tem obrigação de cuidar da curiosidade dos filhos e, a leitura faz parte disso.
 Ler acende a imaginação e quanto mais se lê, mais criativa a pessoa se torna, é por isso que se diz que não existe um bom escritor que não tinha sido um bom leitor.
A leitura pode ficar associada à voz dos pais, a um momento positivo de proximidade, ao afeto, ao colo e ao AMOR. Pode tornar-se um amor para a vida.
Ler não tem que ser uma obrigação ou um castigo, mas pode servir como contrapartida quando uma criança está muito ligada ao digital e não lê por iniciativa própria. Negociar a leitura de um livro que a criança goste para poder jogar computador uma a duas horas por dia, não é de todo uma aberração.
 Quem não lê tem sérios problemas em interpretar o mundo, uma vez que não entende o significado das palavras.
A aventura de ler não tem que começar com os Maias, ou com Os Miseráveis, pode começar com qualquer livro que a criança se interesse. Não adianta impingir os nossos gostos às crianças se elas tem preferência por outros géneros. Se ele quer ler o Maze Runner, deixe-o ler. O gosto pela leitura e o seu aprofundamento vai sendo construído aos poucos. O que precisamos é de gente que adore ler, são essas pessoas que aos poucos vão contagiando os outros com o seu entusiasmo, quer através da palavra, quer através das redes sociais.
Não se ofenda se o seu filho não quer ler o Princepezinho, só porque você o leu aos doze anos e ele mudou a sua vida. Não é nada pessoal. Mostre-lhe uma variedade de livros e de-lhe a escolher. Leve-o a uma livraria de preferência.
O importante é que as crianças comecem a virar páginas, o resto vai acontecendo naturalmente como em todas as histórias.
Boas leituras e até ao próximo post.

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Música das Estrelas - Conto


Nas rugas adivinhava-se a imensa emotividade de Maria: fora uma vida inteira a viver em pleno e a sentir. Naquela noite ao ouvir os primeiros acordes do piano e a voz cristalina da solista os olhos de Maria encheram-se de lágrimas a transbordar de contentamento e prazer. À memória chegou-lhe as longas noites de inverno acompanhadas pelos gemidos dos nocturnos de Chopin e o firmamento estrelado que vislumbrava através da janela da sala enquanto ele tocava. A sua alma poética conseguia nesses momentos escutar a música das estrelas.
 Foi nesse estado de saudade e embalo poético, que um breve instante do passado se desenhou na sua memória: nublado, distante, mas tão vivo. A idade que tinha não sabia, só sabia que aquela música estava entranhada na sua pele até ao último acorde. Ouviu-se uma enorme onda de aplausos e ela rejubilou de alegria e orgulho. O seu filho tinha alcançado a glória naquela noite. O piano, a guitarra portuguesa – que quase chorava – e a fadista que entoou “ Povo que lavas no rio”, arrancam-lhe lágrimas de alegria e saudade. Saudade da meninice em que a mãe lhe dizia «o pai toca a música das estrelas Maria, vê como elas saltitam» e apontava para os pontinhos luzentes lá no firmamento, escuro como breu, através da vidraça da janela. Era uma saudade boa, sã.

E aquela música recordava-lhe outras músicas, tão diferentes, às vezes dançadas, outras só sorvidas em milhares de sítios, quando ainda era jovem: bares, salas de cinema, viagens, ruas. A música de quando era jovem e conheceu o homem que a acompanhou a vida toda, na dor, na alegria, mas também na partilha de ideias e pensamentos. Nos livros que leram, nas batalhas que travaram, na educação doa filhos. Aquela música era a sua alma, a alma de uma menina que cresceu a ouvir o piano dedilhado pelos dedos firmes do pai, homem sensível, e um muro de protecção. Imersa nos pensamentos nem reparou que o marido estava a observá-la, ali, a dois passos dela com um ar que era de amor e complacência. Já sabia que sempre que o neto tocava aquela música, viajava para a infância, não com tristeza, mas com uma nostalgia de quem já viveu mais de metade da vida e quer aproveitar todos os momentos que lhe restam. Avançou até ao marido, apoiada na bengala – admirou-lhe as têmporas brancas – e, de mãos dadas, caminharam até ao palco para abraçarem o artista da guitarra portuguesa: o neto. 

terça-feira, 7 de agosto de 2018

Vale a pena ser escritor independente?





Tornar-se autor/escritor é uma jornada única e individual. Mas, tornar-se autor independente, é algo que requer muito, mas muito, trabalho. Como escritor, se quiser ver o seu trabalho publicado, tem duas alternativas: de um lado a publicação tradicional, pelas editoras convencionais e,  de outro, publicar de forma independente, quer em editoras que fazem edições de autor ( como a Chiado), ou em plataformas como a AMAZON, a maior livraria do mundo. 

Ainda se acredita que a publicação tradicional tenha mais credibilidade e impacto no publico do que a auto-publicação, mas, existem muitas razões pelas quais os autores optam, cada vez mais, pela última. O autor autopublicado tem mais autonomia, mais liberdade, maior rapidez, maiores ganhos ( royalties), mas também maior responsabilidade, sobretudo à medida que vai "crescendo" como escritor. 
Na auto - publicação nem tudo são facilidades, grande parte do sucesso é muito trabalho. 

A jornada do autor independente, começa no dia em que resolve auto-publicar e nem sempre resulta de levar um "não" das editoras. Sabemos que hoje em dia, as editoras só publicam autores que sejam garantia de retorno, como actores, jornalistas, ou seja, figuras conhecidas dos midia que levam as pessoas a comprarem. 
Então para quê sujeitar-se a nem sequer receber resposta das editoras, depois de enviar o original? Não, não vale mesmo a pena, a não ser que seja masoquista. Em Portugal, um autor para ver o seu trabalho publicado numa editora convencional, tem que enveredar pela edição de autor,  sujeitar-se a gastar muito dinheiro em editoras que apenas imprimem os livros (gráficas disfarçadas) e depois deixam o autor com os livros para vender por conta própria. Provavelmente no Brasil funciona de forma igual. Embora existam casos de sucesso, penso que se contam pelos dedos das mãos quem tenha conseguido ser aceite numa editora convencional. Em Portugal um dos casos de sucesso, é o caso de Pedro Chagas Freitas, que começou em edições de autor na CHIADO, e mais tarde apareceu com outra chancela, mas, só depois de muito trabalho de marketing.  

Muito trabalho o espera!
 Depois de escrever, revisar e editar sozinho, ainda tem a capa do livro por fazer. Se é uma pessoa com múltiplas competências então conseguirá fazer tudo sozinho, utilizando as diversas ferramentas disponíveis online ( Photoshop, Canva etc). Mas também não tem que fazer tudo sozinho. Pode encontrar alguém que lhe faça a capa por um preço muito em conta ( pesquise capistas online e encontra rapidamente), e peça a uma pessoa da sua confiança para lhe fazer uma primeira leitura do livro, e depois  a outra que o ajude na revisão e, finalmente, alguém que faça a última revisão ( aquelas coisas minúsculas que nos escapam, mesmo depois de dez passagens), e só então publique o seu livro. Convém que não tenha erros mas, se tiver, ainda que poucos, a amazon irá avisá-lo para que os corrija e dá-lhe todos os pormenores do que deve corrigir. 

De inicio parece que está tudo mal. O livro não vende e o autor começa a conceber uma forma de reverter o problema; é quando descobre que tem que utilizar o marketing  e sobretudo escrever mais livros. Escrever mais é a melhor forma de marketing. Quando tem dois ou três livros publicados começa então a ver a sua renda mensal a aumentar ( comigo foi assim) e o entusiasmo para escrever mais, cresce. Os leitores voltam sempre para ler um dos seus livros novos e, ao continuar a escrever, consegue até ressuscitar os livros mais antigos. 

Ao fim de algum tempo o autor independente, percebe que tem que encontrar formas de divulgar o seu trabalho. Cria página de Facebook, Instagram, Pinterest e mais importante que estas ferramentas, é ter um blog. Crie um na Wordpress, ou na Blogger, conforme se sinta mais confortavel com a tecnologia. O meu é da Blogger e tem dominio personalizado, mas acredito que a Wordpress lhe dará um maior retorno, no entanto, pela facilidade que tenho com a tecnologia da Blogger, mantenho-me fiel. 
Uma, senão a maior vantagem da auto-publicação é que os livros estão sempre lá. Não são retirados de circulação como acontece com a publicação tradicional e, como já referi antes, cada vez que lança um livro, está a ressuscitar os anteriores, porque, se os leitores gostarem do que escreve, procuram outras obras suas. Persista. 

A formula do sucesso é a qualidade. Qualidade da escrita, da apresentação do livro, profundidade dos personagens e pertinência da história. No entanto, fique o aspirante  a autor independente descansado que existe mercado para todos os nichos. Nos blogues sobre literatura, sobretudo os brasileiros, vêem-se muitas criticas sobre a ascensão dos livros eróticos, uma vez que estão quase sempre no top de vendas.  Estar no top, nem sempre quer dizer que é o mais vendido, uma vez que existem vários factores para a ascensão do livro, desde as vendas, ao número de criticas.  Até há algum tempo muitas delas eram fraudulentas - alguns autores pediam a amigos e conhecidos que fizessem criticas -, felizmente a amazon tem forma de escrutinar a proveniência das mesmas e, à mínima ligação, não publica a critica. Portanto, não se preocupem se tiverem qualidade vão vender, e já agora vos digo que a qualidade é subjectiva. O que é qualidade para uns pode não ser para outros. Por isso haverá leitores para todos os géneros, e para si também. Não tenha medo do sucesso dos outros autores, eles não são seus inimigos. Por vezes os piores inimigos dos escritores, são os colegas. Seja carinhoso e gentil com os outros, ainda que ele ou ela, não escreva o seu género preferido. 

Onde é que se vendem livros em Português? Em todo o mundo, porque a língua portuguesa está espalhada por aí - o português de Portugal e o português do Brasil. Não tenha receio de escrever em português, vai encontrar mercado para si de certeza. Mas onde?, pergunta o autor. Respondo que sobretudo no Brasil. A maioria dos meus leitores são brasileiros, embora já tenha conquistado uma pequena percentagem de portugueses que utilizam a amazon espanhola, porque, infelizmente em Portugal ainda não existe amazon. 

E deveria escrever em Português de Portugal ou do Brasil?  Fica ao seu critério. Até agora tenho escrito em português de Portugal e não deixei de vender no Brasil por causa disso, no entanto, reconheço que venderia mais se escrevesse em português do Brasil e, em atenção aos meus leitores, o próximo livro terá as duas versões, a leitura é mais prazerosa se os termos forem conhecidos. 

É fácil receber o dinheiro que ganha com os seus livros. Pessoalmente recebo através da Payonneer, um cartão Mastercard. A Payonneer pertence ao Bank of América e é bastante eficiente. Você consegue controlar quando recebe e quando gasta através da sua conta online. A melhor forma de usar este cartão é fazendo pagamentos, ou seja, use normalmente, ao invés de fazer transferências para a sua conta de origem, no seu país.  A AMAZON, obriga a ter uma conta num banco Americano para receber o dinheiro por transferência bancária, caso contrário terá que receber por cheque e demora muito mais tempo. Na Payonneer é certinho, ao dia 29 já tem o dinheiro na sua conta. 

Porquê publicar na AMAZON? Por diversos motivos, mas principalmente pela facilidade de trabalho e qualidade da plataforma, quer dos ebooks ( www.Kdp.com), quer da impressão sob demanda (www.createspace.com) As duas plataformas já possibilitam a impressão em papel, no entanto eu continuo a preferir a Createspace para publicar em papel, tem mais possibilidades de layout. Outra das razões é a financeira. Você recebe 70% nos ebooks ( se tiver exclusividade com a amazon) e pode usufruir de algumas ferramentas de marketing que lhe possibilitam divulgar o livro, e 35% nos livros em papel. Ora, considerando que as editoras tradicionais apenas pagam cerca de 10% do preço de capa, ao autor, vale a pena publicar de forma independente. 

Até breve! Caso tenham dúvidas, posso esclarecer através da caixa de contacto.



domingo, 29 de julho de 2018

A Cápsula do Tempo - Romance ( excerto)





Imagens retiradas da internet. 

(...)Lá estava a foto da cobra e do crocodilo. Ele e uns cinco homens seguravam uma jibóia morta, ao longo do seu comprimento e, na foto ao lado, o mesmo grupo pousava junto a um enorme crocodilo onde um homem fardado de verde caqui, assentava  uma metralhadora. Se fosse hoje era tido como um ato de barbárie, mas naquela época, anterior a 1975, era uma proeza. Soldado que era soldado - e homens com eles no sitio -, matava um daqueles bichos abundantes pelas selvas africanas, para mandar uma foto para as madrinhas de guerra, comprovando a sua bravura. 
Joana passava as folhas lentamente. Ali estava o seu Adérito com o alferes Torrinha e com o capitão Antunes, tisnados pelo sol de Angola, e com o peso da guerra nos ombros embora mostrassem um grande sorriso. Como a vida pode ser enganadora. A guerra transformara o seu homem num monstro.
Dois meses depois, de receber aquelas fotografias, chegava um aerograma a dizer que Adérito terminara a comissão em Angola e vinha de férias à metrópole. Quando soube a noticia já ele vinha no barco que o conduziria a Lisboa.
Sentia um frio na barriga só de pensar em ver aquele homem bonito e sorridente. Se o amor era aquilo, podia dizer que amava o seu homem. Decerto ele teria muitas madrinhas de guerra[1], mas a namorada era ela. Ela era a escolhida.
Hoje duvidava que ele a tivesse escolhido pelos melhores motivos. Dali a uma semana Adérito dera-lhe o primeiro desgosto.
O comboio estava atrasado quase uma hora, mas Adérito prometera telefonar para a venda dos Oliveiras a avisar que ia a caminho de casa, quando embarcasse no comboio e não o fizera. As duas famílias estavam na plataforma, ansiosos por verem chegar o bravo soldado que escapara aos “turras” e às malvadas minas que ceifavam vidas. Mas a espera não dera frutos. Adérito não viera no comboio. Desembarcaram três dos filhos da terra que estavam na sua companhia e foi com o coração apertado que viu Manuel do Freixo, aproximar-se.
Os olhos apaixonados do jovem soldado raso, olharam-na com um misto de amor e pena:
- Ele seguiu para o Porto. Tem lá uma madrinha de guerra que foi ver – disse-lhe Manuel.
Preferia ter sabido da sua morte. Talvez não lhe doesse tanto.
Manuel era apaixonado por Joana fazia anos, e foi com algum prazer que lhe deu a noticia que o seu namorado preferia outra. O recado – e o que ele tinha de subentendido – estava dado. Joana percebera perfeitamente que ele o fizera por despeito. Sentia que Manuel lhe estava a dizer que mais valia ter aceite o seu amor, porque ele, Manuel, nunca a trataria dessa forma. Adérito Simões era o soldado que apanhara um esquentamento mal pusera os pés em Luanda e se enrolara com quantas prostitutas por lá encontrou. Joana estava muito enganada quanto ao homem que escolhera para namorar.
 Joana suspirou. Como teria sido a sua vida se o marido não tivesse ido à guerra e não se entregasse à bebida?
Com o álbum aberto sobre as pernas envoltas numa manta, a memória recuou mais uns bons anos e recordou aquele ano em que decidiram casar. Nesse ano estava doente, sem que os médicos descobrissem o nome da maleita que a impedia de trabalhar por longos períodos. Casaram em 1975, oito meses depois da guerra terminar e quando Adérito já não corria perigo de ser mobilizado outra vez para alguma província das colonias portuguesas. A noite de núpcias passou-a no hospital com cólicas abdominais e o seu homem a festejar o casamento com os amigos. Joana tinha vinte e três anos e a esperança que todas as jovens alimentam ao longo da adolescência: casar e ser feliz ao lado do homem por quem se apaixonara.
Tudo foi tão diferente que ainda hoje lhe custa a aceitar que a vida é tão injusta com as pessoas. Quando voltou para casa, com o aviso que fizesse dieta de lacticínios, encontrou Adérito alcoolizado e a receção não foi a que esperava. Tomou-a à força e naquele instante, viu a romantização da sua primeira vez, tornar-se numa coisa dolorosa e traumatizante. Depois, nos dias, meses e anos que se seguiram, Joana passou o tempo a dar aulas, nas escolas primárias da região, e a tentar manter as terras de Adérito a produzir, com a colaboração do capataz.(...)

Caras(os) leitoras(es) aqui fica uma amostra de degustação do meu próximo livro a ser lançado lá para o fim do ano. Tinha previsto publicar no Verão, mas obrigações familiares, tem-me "roubado" tempo à escrita. 
Adianto que depois de muito pensar, vou publicar o ebook em português do Brasil e o livro físico em português de Portugal. Espero com isso alcançar mais leitores brasileiros que preferem ler em português brasileiro. 

Até ao próximo post. 
Espero reacções vossas ao excerto e ao tema do livro. 




[1] Jovens que se correspondiam por carta com os soldados que estavam na guerra do Ultramar, e que podiam tornar-se namoradas, amantes ou esposas.