Apresentando Alex Steel
"Há dois meses que estava em Timor. Fora enviado directamente de Moçambique,
onde ficou o navio João Belo, no qual tinha esperança de permanecer. Mas, ao
aportar, foi imediatamente colocado noutro barco em direcção a Timor. Queriam
ter a certeza que não voltava para Portugal, e com a movimentação de guerra em
torno de Timor era impossível arranjar qualquer transporte civil para Portugal.
Os mares e oceanos estavam pejados de navios de Guerra e nenhum outro barco se
atrevia a cruzar as suas águas.
Ricardo passava os dias nas instalações do exército português em funções de
secretaria, e a sonhar com a forma de escapar dali. Há uns anos daria tudo para
estar longe de casa e em paz, sem as maquinações da mãe e sem a polícia de
vigilância nos seus calcanhares. Mas hoje não se importava de estar em Lisboa
só para poder ver Helena.
Ricardo fechou o “The Evening Post” e suspirou. De tédio e desconforto. Era
Novembro e o calor era intenso naquela parte do planeta. Sentiu saudades do
frio de Portugal. Do frio da Natal. Nem nos anos que permaneceu em Angola sentiu
tantas saudades do país, mas, agora tinha um motivo forte para querer voltar: Helena.
Cada dia que passava desesperava por saber notícias de Helena. Há dois
meses que lhe tinha enviado uma carta e, até agora, não recebera qualquer
resposta. Com o rebentar do conflito bélico em Timor, e as movimentações dos
japoneses no pacífico em redor da ilha, sabia que era difícil, a chegada de
qualquer notícia.
**
Faltavam umas semanas para o Natal e as saudades consumiam-no. Sentia falta
daqueles olhos verdes, argutos e rebeldes, da silhueta cheia que ao passar
deixava um rasto de perfume lavanda no ar.
Helena era uma flor silvestre mas com a sofisticação e a beleza de uma
camélia de jardim. Ricardo recordava a meninice dela e o seu interesse por tudo
o que existia dentro dos livros, no mundo e dentro da mente das pessoas. Até
que um dia teve que partir e esqueceu-se da pirralha que o perseguia pela casa
em busca de atenção e conhecimento do mundo. Quando se recorda desse tempo não
consegue deixar de esboçar um sorriso ainda que o cenário não seja para rir.
Aqueles tempos eram de felicidade pura e sem entraves. Ele era jovem e
idealista e ela uma criança quase mulher que o idolatrava.
Terminara de ler um comunicado do governo português a indicar que não se
opunha a que os australianos e os holandeses defendessem a ilha desde que a soberania fosse sempre portuguesa, caso o Japão invadisse o território
timorense. Ricardo temia que o panorama fosse mudar em breve, havia suspeitas
que o Japão preparava algo em grande.
Ricardo pegou em papel de carta e começou a redigir uma para Helena
endereçada à morada de Alexandre Steel.
Era o dia seis de Dezembro de 1941,
e começou por descrever a paisagem e o que de mais bonito existia à sua volta.
Em cinco semanas a carta talvez chegasse ao destino, perto do Natal, e Helena
ia ficar a saber de todo o amor que ele lhe devotava. Ricardo fez as contas por
alto e dali a um ano estaria em Portugal de novo, livre, por bom comportamento e
por ter cumprido as suas funções enquanto “voluntário” na colónia."
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